domingo, 8 de maio de 2011

Aprendiz de petralha?

Chalita, o "bonito", na foto de Eduardo Knapp, da Folhapress.
O deputado federal Gabriel Chalita (PSB por enquanto) é mesmo um homem surpreendente. Ele andou meio bravo comigo porque cotejei uma entrevista sua com uma palestra.
Em uma, seus pais eram amantes do saber; em outra, o pobre menino era esmagado por uma família infensa a seus dotes intelectuais.
Também me espantei um tanto com uma velhinha num asilo, uma professora, que fazia o menino Gabriel, aos oito anos, ainda um anjo, ler Sartre…
Se a minha memória não falha, quando ele devolvia o livrinho à mestra, dizia: “Não entendi nada, mas adorei!”
Não entender, mas adorar, é coisa de quem aprende com o coração, entenderam?
No texto de que ele não gostou, também confronto duas informações: uma dá conta de que um apartamento espetacular em que ele mora, aqui pertinho, avaliado em R$ 8 milhões, foi comprado com parte de uma herança familiar; outra informa que ele era pobre de marré, marré, marré.
Não entendi nada, mas adorei.
Chalita está na Folha de hoje, numa entrevista a Morris Kachani. Aos 42 anos, já escreveu 7.835 livros — 54 para ser mais preciso. Diz estar com “tesão” para ser prefeito. Eu poderia escrever que os paulistanos aguardam apreensivos. Mas diriam que estou sacaneando o deputado neo-socialista, que está de mudança para o velho PMDB.
Chalita se coloca como “o” católico da política. Isso o obrigaria a não mentir, a não levantar falso testemunho, nem para prejudicar seus adversários nem para proteger seus aliados. Leiam o que segue:
Folha - Que pensa do aborto?
Chalita -
Sou contra o aborto. Sou um defensor ardoroso do direito à vida. Há bens inalienáveis, como a vida.
Folha - Acha que Dilma e Serra também são contra ou foi apenas um jogo de cena?
Chalita -
Não sei. Nas conversas com a Dilma, ela dizia que os ricos fazem e os pobres não, daí a injustiça. O Serra acho que era mais favorável.
Se Dilma disse mesmo aquilo a Chalita, falou uma grande besteira. Mas pode ser apenas a aplicação prática de seu método criativo, agora à política.
Pobres e ricos fazem aborto no Brasil — os pobres mais do que os ricos numérica e percentualmente porque têm menos acesso à informação, ao planejamento familiar e a métodos contraceptivos. Mas essa desigualdade não torna o aborto justo ou injusto.
Se Dilma disse mesmo essa tolice a Chalita, não posso asseverar. Em nome da verdade, o soi-disant “católico” Chalita deveria lembrar que a agora presidente fez a defesa explícita do aborto, mais de uma vez, como um “direito” da mulher — e, pois, segundo as palavras do próprio, isso não a caracteriza como uma “defensora ardorosa” da vida.

Chalita tem pela verdade o mesmo rigor evidenciado na sua produção sobre Sócrates: “O Serra acho que era mais favorável [ao aborto]“. Não há uma só declaração do ex-governador — à diferença de Dilma — em defesa da legalização do aborto ou de sua prática. O bom “católico” Chalita está apenas fazendo política mesquinha. Ele tem o direito de se opor a quem quiser, mas, para um pensador da ética, sua prática é lastimável.
Deixo claro que não o considero um escritor de auto-ajuda no sentido tradicional da expressão. Eu realmente não creio que alguém ganhe alguma coisa ao ler um livro seu. Folheei um único num consultório médico, perdido em meio a revistas “Caras” e “Quem”… Era aquele sobre a ética do menino ou algo assim… Tive um ataque de riso logo na segunda página. Os demais pacientes devem ter achado que eu tinha errado de especialista. Chalita e “auto-ajuda”, sim: sabe como ninguém ajudar o próprio autor… Ninguém pode condená-lo por isso se há quem o leia. Chalita tem de se conformar: não é um gênio; trata-se apenas de um rapaz muito esperto.
Na abertura da entrevista, informa a Folha:
” (…) enquanto posava para as fotos, [Chalita] afirmou: “Esses árabes bonitos são fáceis de fotografar”.
Ok. Sua pretensção de ser bonito chega a ser mais justa do que a de ser inteligente.
*Extraído do texto de Reinaldo Azevedo

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