
SINTONIA – O engenheiro Valter Cardeal, diretor da Eletrobras e
braço-direito
da presidente no setor elétrico: conluio com o tesoureiro João
Vaccari Neto em
Angra 3. (Alan Marques/Folha Imagem/VEJA)
Segundo a delação premiada do
empreiteiro Ricardo Pessoa, negociação do contrato de construção da Usina
de Angra 3 serviu para que Valter Luiz Cardeal, diretor da Eletrobras que tem
livre acesso ao gabinete da presidente, cobrasse do consórcio de
construtoras “doação” à campanha petista do ano passado.
Quando era presidente, Fernando
Henrique Cardoso cultivou a fama de exterminador de crises, que, dizia-se,
sempre saíam do Palácio do Planalto menores do que entravam. De Dilma Rousseff,
fala-se exatamente o oposto. Centralizadora e avessa a negociações, a
presidente semeou um quadro de recessão econômica e de derrotas no Congresso.
Rejeitada por nove em cada dez brasileiros, ela também perde apoiadores no
grupo de políticos e empresários que ditam o rumo do país. Até o ex-presidente
Lula, seu mentor, lhe faz críticas cada vez mais contundentes. Com apenas seis
meses de segundo mandato, Dilma está só, não exerce o poder na plenitude nem
consegue mobilizar a tropa governista. De quebra, é acossada por investigações
que podem destituí-la do cargo - entre elas, a Operação Lava-Jato, que
esquadrinha o maior esquema de corrupção da história do país. Diante de uma
conjuntura assim, a maioria dos governantes optaria por mais diálogo, sensatez
e pés no chão. Dilma não. Ela reage à crise com argumentações destrambelhadas,
otimismo exagerado e erros primários de avaliação. Pior: como de costume,
alimenta a agenda negativa.
Na semana passada, a presidente, contrariando
o mais elementar dos manuais de política, fisgou a isca dos adversários e
abordou novamente em público a possibilidade de enfrentar um processo de
impeachment. "Eu não vou cair, isso é moleza", desafiou em entrevista
ao jornal Folha de S.Paulo, na qual chamou setores da oposição de golpistas. A
resposta foi imediata: "Tudo o que contraria o PT é golpe", ironizou
o senador Aécio Neves (PSDB). Nos regimes democráticos, a destituição de um
mandatário depende de provas, do aval das instituições e do apoio da opinião
pública (veja a reportagem na pág. 54). Em sua defesa, Dilma alega que jamais
se locupletou de dinheiro sujo. Falta a essa versão o respaldo inequívoco dos
fatos. VEJA teve acesso a mais um testemunho de que propina cobrada em troca de
contratos - desta vez, no setor elétrico, a menina dos olhos de Dilma -
abasteceu os cofres do PT em pleno ano eleitoral. Os operadores da transação
criminosa foram o onipresente João Vaccari Neto, então tesoureiro do partido, e
Valter Luiz Cardeal, diretor da Eletrobras, o "homem da Dilma" na
estatal e um dos poucos quadros da administração com livre acesso ao gabinete
presidencial.
O relato desse novo caso de desvio de
verba pública para financiar o projeto de poder petista consta do acordo de
delação premiada firmado entre o engenheiro Ricardo Pessoa, dono da construtora
UTC, e o Ministério Público Federal. Num de seus depoimentos, Pessoa contou que
em setembro do ano passado o consórcio Una 3 - formado por Andrade Gutierrez,
Odebrecht, Camargo Corrêa e UTC Engenharia - fechou um contrato para tocar
parte das obras da Usina de Angra 3. A assinatura do contrato, estimado em 2,9
bilhões de reais, foi precedida de uma intensa negociação. A Eletrobras pediu
um desconto de 10% no valor cobrado pelo consórcio, que aceitou um abatimento
de 6%. A diferença não resultou em economia para os cofres públicos. Pelo
contrário, aguçou o apetite dos petistas. Tão logo formalizado o desconto de
6%, Cardeal chamou executivos do consórcio Una 3 para uma conversa que fugiu
aos esperados padrões técnicos do setor elétrico. Faltava pouco para o primeiro
turno da sucessão presidencial. O "homem da Dilma" foi curto e
grosso: as empresas deveriam doar ao PT a diferença entre o desconto pedido
pela Eletrobras e o desconto aceito por elas. A máquina pública era mais uma
vez usada para bancar o partido em mais um engenhoso ardil para esconder a
fraude.
A conversa de Cardeal foi com Walmir
Pinheiro, diretor financeiro da empresa, escalado para tratar dos detalhes da
operação. Depois dela, Vaccari telefonou para o próprio Ricardo Pessoa e cobrou
o "pixuleco". "Quando soube que a UTC havia assinado Angra 3,
João Vaccari imediatamente procurou para questionar a parte que seria destinada
ao PT - o que foi feito pela empresa", relatou o empreiteiro. Aos
investigadores, Pessoa fez questão de ressaltar que, segundo seu executivo, foi
Cardeal quem alertou Vaccari sobre a diferença de 4 pontos percentuais entre o
desconto pedido pela Eletrobras e o concedido pelas construtoras. Perguntado
sobre o que sabia a respeito de Cardeal, Pessoa afirmou: "É pessoa próxima
da senhora presidenta da República, Dilma Rousseff".
*Via Veja.com - Com reportagem de Adriano Ceolin e Mariana Barros
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