domingo, 23 de outubro de 2016

"Este não é o começo do fim de Temer"

Por ora, Christopher Garman, da Eurasia Group, não enxerga chances efetivas de Temer sair antes de 2018.
Uma hecatombe parece próxima de Brasília, após a prisão de Eduardo Cunha e da Operação Métis, lançada na sexta pela Polícia Federal e que atinge diretamente Renan Calheiros. Há quem veja, nessa conjunção corrosiva de fatos, o começo da derrocada de Michel Temer.
Quem pensa assim está muito enganado. Esta é a avaliação do cientista político Christopher Garman, chefe da área de pesquisas da Eurasia Group, uma das mais respeitadas consultorias de risco político do mundo. Tanto que, durante a semana, a Eurasia cortou de 20% para 10% as chances de Temer não concluir seu mandato.
Nesta conversa com O Financista, Garman explica por quê:


Financista: Há quem diga que a prisão de Cunha representa o início do fim do governo Temer. A Eurásia, contudo, vê apenas 10% de chances de Temer não terminar o mandato. Por quê?
Christopher Garman: Discordamos da avaliação de que a prisão de Cunha, de fato, possa ser o início do fim do governo Temer. A derrubada de um presidente depende de vários fatores. Não provém só de uma acusação. O impeachment de Dilma, por exemplo, ocorreu não só por causa de acusações que vieram da Lava Jato e de burlar a Lei de Responsabilidade Fiscal, mas por causa de uma tremenda crise econômica e social, e uma crise de confiança na sua liderança, tanto no setor privado, quanto na classe política. E a provável delação de Cunha acontece em um momento totalmente distinto. Temer conta com o apoio maciço do Congresso, que enxerga nele a única maneira de construir uma ponte até 2018. Quanto mais o tempo passar, sem que Temer sofra uma denúncia grave de corrupção, e quanto mais apoio que ele angariar, menores serão as chances de ele não terminar o mandato.


Financista: Mesmo se isso se somar à Operação Métis, que atinge diretamente Renan Calheiros?
Garman: Não, não abala. O fato é que teremos muitas denúncias pela frente. Mas, para derrubar esse governo, serão necessárias evidências muito fortes contra Temer, a ponto de ele perder as condições de governar.


Financista: A Eurásia afirma que o Congresso é o que corre mais riscos com a prisão de Cunha. Isso vai atrapalhar a tramitação das reformas?
Garman: A Lava Jato não vai impactar as reformas no curto prazo. Vemos isso como um risco mais para 2017. Primeiro, porque a investigação sobre políticos demora um pouco. Não só no julgamento no Supremo que está andando, mas também pelo tempo necessário de Cunha negociar uma delação premiada com os procuradores. Segundo, o próprio êxito de Temer nas reformas, que levaria a economia a voltar a crescer no ano que vem, deve diminuir o senso de urgência no Congresso. Logo, votar contra o governo em um ambiente de crescimento econômico carrega um peso menor.


Financista: Temer será capaz de aprovar a reforma da Previdência, uma pauta impopular, em um momento em que o Congresso teme a delação de Cunha?
Garman: Achamos que alguma versão da reforma da previdência deve ser aprovada, mas nossa convicção sobre esse resultado não é alta, e o governo terá que diluir boa parte de sua proposta. Existe um certo consenso no Congresso para estabelecer uma idade mínima, mas os congressistas terão receio de aprovar medidas com um impacto mais expressivo no curto prazo, quando deputados e senadores estarão mais de olho nas eleições de 2018. Significa que aprovar a desvinculação do mínimo será bem difícil. Negociar tudo isso em um contexto de lideranças sob investigação é ainda mais difícil.


Financista: Neste cenário, o que os brasileiros podem esperar, de fato, do governo Temer até 2018?
Garman: No fundo, o governo Temer vai representar uma agenda reformista bem importante, mas que será incompleta. Logo, quem for eleito em 2018, muito provavelmente, terá de continuar uma agenda de reformas nada fácil.

* Por Márcio Juliboni

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