"Quando um pagodeiro, um jogador de futebol e um funkeiro, fantasiados de gorilas e cercados por popozudas de biquíni à beira de uma piscina, se divertem em um clipe do pagode Kong, e são acusados de racismo e sexismo pelo Ministério Público Federal em Uberlândia por "unir artistas e atletas em um conjunto de estereótipos contra a sociedade, comprometendo o trabalho contra o preconceito", a coisa tá preta.
Alexandre Pires não é só um pagodeiro, é cantor romântico milionário, com carreira internacional, queridíssimo do público. Funkeiro é só um pouco de Mr. Catra, figuraça da cena musical carioca, rapper famoso nacionalmente por suas letras contundentes e suas paródias. E não é só um jogador de futebol: é Neymar. Não por acaso, uns mais e outros menos, são todos negros, ricos e famosos por seu talento, ídolos das novas gerações do Brasil mestiço. Já o procurador é branco, preocupado em proteger os negros para que não façam mal a eles mesmos.
Assim como a beleza, o preconceito também está nos olhos de quem vê. Quem ousaria associar o genial Neymar, o galã Alexandre e o marrentíssimo Mr. Catra a macacos? Só um racista invejoso...
O procurador ficou especialmente incomodado quando Mr. Catra, vestido de gorila, cercado por gostosonas louras, ruivas e morenas e feliz como pinto no lixo, diz ter "instinto de leão com pegada de gorila". Seria uma sugestão preconceituosa da potência sexual afrodescendente. Êpa! Elogio não é crime.
Freud explica: quando João fala de Pedro, está falando mais de João do que de Pedro. Nas falhas, defeitos e intenções que um atribui ao outro, revela-se mais de si do que do outro".
*Texto de NELSON MOTTA, no O Estado de São Paulo
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