sábado, 23 de julho de 2011

Agencia Nacional da propina

Por Diego Escosteguy, com Murilo Ramos, na revista Época:
ÉPOCA obteve vídeos, documentos e cheques que revelam como o aparelhamento partidário transformou a Agência Nacional do Petróleo numa central de achaque e extorsão.
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PROVAS DA EXTORSÃO
Com a ajuda do MP, a advogada Vanuza Sampaio gravou um encontro que manteve com dois assessores da ANP, que exigem propina de R$ 40 mil para resolver um problema de um cliente dela. Abaixo, trecho do depoimento prestado pela advogada ao MP, no qual ela detalha o caso, e o cheque que um dos assessores da ANP recebeu de um advogado ligado ao maior adulterador de combustível do país.
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Às 16h23 do dia 5 de maio de 2008, uma segunda-feira, dois assessores da Agência Nacional do Petróleo (ANP) encaminharam-se discretamente ao escritório da advogada Vanuza Sampaio, no
centro do Rio de Janeiro. Os dois, Antonio José Moreira e Daniel Carvalho de Lima, acomodaram-se na sala de reuniões do escritório, tomaram cafezinho e conversaram por alguns minutos sobre amenidades. Ato contínuo, a advogada Vanuza assomou à porta. Vanuza é a advogada com mais volume de processos na ANP; conhece profundamente a agência. Tem como clientes distribuidoras
de combustível, postos e empresários do setor de petróleo e gás – todos dependem da ANP para
tocar seus negócios. Depender da ANP, conforme investigou ÉPOCA nos últimos dois meses, significa sofrer continuamente o assédio de tipos como Moreira e Daniel. Não são os únicos.
 Há muitos como eles. Mas, para a turma que transformou a ANP num cartório de extorsão,
aquela não era uma segunda-feira tão ordinária. Daquela vez, dois deles foram gravados em
vídeo, em pleno expediente subterrâneo. ÉPOCA obteve cópia dessa gravação, que integra
uma investigação sigilosa do Ministério Público Federal e da Polícia Federal.
A pedido de ÉPOCA, a autenticidade do vídeo foi atestada pelo perito Ricardo Molina.
 “A gravação é autêntica e não sofreu nenhuma manipulação”, disse Molina. O vídeo tem
53 minutos, três personagens e um repertório espantoso de ilegalidades, abusos e escracho
com a coisa pública. São 53 minutos de corrupção exposta em seu sentido mais puro. Não
há nenhum vestígio de decoro. O eventual medo de ser pilhado desaparece e cede lugar ao
deboche. Não há diálogo em código ou fraseado evasivo. É tudo dito na lata. Esse descaso
pode ser explicado pela impunidade com que a longeva máfia dos combustíveis atua no país.
Nos últimos anos, a PF e o MP já produziram provas robustas contra expoentes desse grupo.
Até o Congresso criou uma CPI para investigar os crimes – que engendrou ainda mais corrupção.
Usina de malfeitores
Propina de R$ 40 mil, divisão de dinheiro sujo, achaque a empresas: há de tudo no vídeo
de corrupção da ANP
“Quarenta mil reais é razoável?”Neste trecho, os dois assessores da ANP
(Antonio José Moreira e Daniel Carvalho de Lima) dizem à advogada Vanuza
Sampaio que a Petromarte, cliente dela, terá de pagar R$ 40 mil de propina para
resolver uma pendência na agência – com o aval do então superintendente de
abastecimento da ANP, Edson Silva, dirigente do PCdoB

Moreira: Eu conversei com o Edson (superintendente da ANP) e ele não tinha
muita noção de valores, você entende? Aí ele falou que era possível, que ia
mexer. Mas ele é lento. Advogada: É baiano.
Moreira: Baiano... Aí ele me falou: “Ó, você não quer conversar agora em
torno de 40 mil reais? Você acha razoável? Quanto você acha razoável?”.
Falei “não sei, Edson, não sei quantificar, não sei valor”. E foi a primeira
vez que aconteceu alguma coisa. A gente pode estabelecer um bom relacio-
namento. Aí ele falou isso, que ficaria com 25 (mil reais) e daria 15 (mil reais)
pra vocês. Esse é do Rodomarte. É... É do Petromarte.
"É para arrancar dinheiro mesmo?"
Depois de cobrar a propina, os assessores oferecem uma parceria à advogada Vanuza.
Querem que ela achaque a empresa Rodonave, objeto de um processo na ANP.
Vanuza se espanta:
“Mas é para arrancar dinheiro mesmo?”

Moreira: Tá na minha mão um processo... O interesse é muito grande. (Empresa)
tradicional chamada Rodonave, de Manaus. Advogada: Mas por que querem cance-
lar o registro dela? (...) É para arrancar dinheiro? Moreira: Não sei... não, eu acho
que não é para arrancar dinheiro (...) Eu também não queria me indispor, chegar e
ligar para a Rodonave... Então, se você tiver interesse, te dou uma orientada.


Lógica Petista
Em seguida, os três põem-se a discutir as diferenças entre os corruptos da agência.
Roberto Ardenghy, antecessor de Edson Silva na Superintendência de Abastecimento,
é citado como exemplo de negociante voraz. Diz o assessor Moreira: “Ele tinha uma
lógica muito à petista. Era muito para ele”

Advogada: Ele (Ardenghy) sempre me travou de uma forma muito inteligente.
Só hoje consigo ver o que ele ganhava de um outro lado.
Moreira: (...) Era uma lógica muito à petista. Era muito pra ele e ele avançava
também para todos os lados (...) Uma vez eu trouxe um caso, ele queria cobrar
muito. Falei “Ardenghy, não é o momento de cobrar muito”. Ele falou “não, mas
se a gente não cobrar muito (...) Se a gente cobrar pouco, você vê fantasmas todos
 os dias”.

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