sábado, 2 de abril de 2016

Teses enganosas.


O ministro Nelson Barbosa fugiu dos fatos no Congresso. Disse que o governo cumpriu a meta fiscal em 2015, que não houve operação de crédito com bancos públicos e que o TCU mudou o entendimento ao longo do ano. Os fatos: o TCU apenas exigiu que a lei fosse cumprida, a dívida com os bancos tanto existia que no fim do ano foram pagos R$ 72,4 bilhões, e a meta só foi cumprida porque mudou.
Quem paga essa montanha de dinheiro é porque está devendo. Óbvio. Então, sim, o governo devia aos bancos públicos e isso é proibido por lei. E dizer que a meta foi cumprida é desrespeitar inteligência alheia. A meta inicialmente era de R$ 66 bilhões de superávit. Em 2 de dezembro, o governo conseguiu aprovar uma mudança da “meta” formatada no tamanho certo para caber o rombo que tinha feito. O ano terminou com déficit de R$ 119,9 bilhões.
Barbosa disse que só falaria de 2015 e desta forma fugiu do desconforto de ter que explicar a lambança de 2014. Assim também ele reforça uma das teses da defesa da presidente Dilma, que sustenta que os acontecimentos de 2014 não interessam porque era outro mandato. O problema é que as pedaladas ocorreram principalmente no último ano de mandato. Permaneceram em parte no ano passado porque o governo teve que recuar diante da pressão do TCU. De qualquer modo, as pedaladas desorganizaram a economia brasileira de forma duradoura e ainda estamos vivendo os efeitos da bagunça fiscal.
Sua tese é que não houve qualquer empréstimo junto a banco público porque a conta de suprimento — pela qual o governo paga benefícios sociais — fica às vezes negativa, mas logo a diferença foi coberta. Não é verdade com Dilma. O TCU expôs claramente isso durante a apreciação das contas, ao mostrar, com um gráfico, que a conta com a Caixa ficou apenas ligeiramente negativa e por breves períodos durante o governo Lula, mas abriu um rombo a partir de 2013 e chegou a ficar negativa por vários meses no valor astronômico de R$ 6 bilhões em 2014. Tanto foi um problema que a CEF entrou na Justiça para receber os atrasados. Não é razoável deixar um negativo deste tamanho por tanto tempo, porque isso na prática vira uma operação de crédito.
Barbosa disse que a conta de equalização de juros sempre existiu. Claro que existe há muito tempo e esse não é o ponto. Os bancos emprestam a juros baixos, e o governo repassa aos bancos a diferença. A questão é o governo demorar tanto a quitar o atrasado, a tal ponto que o banco financia o Tesouro. O ministro ressaltou que o governo baixou portaria encurtando para seis meses o pagamento dessa diferença de juros. O governo fez isso pressionado pelo TCU. Nelson Barbosa esqueceu de dizer que ele mesmo, quando era o segundo no Ministério da Fazenda, assinou a portaria que adiava por dois anos o pagamento ao BNDES. E que, em função disso, ele próprio está sob risco de ser inabilitado para função pública.
O que houve é que no ano passado o então ministro Joaquim Levy se esforçou para quitar essa montanha de atrasados com os bancos. A partir da celeuma sobre as contas de 2014, o governo passou a corrigir o que ele mesmo fizera. Mesmo assim, foi só no último dia útil de 2015 que o governo pagou R$ 55,6 bilhões dos atrasados de 2014 e R$ 16,8 bilhões de valores devidos em 2015. O total foi de R$ 72,4 bilhões.
O ministro Nelson Barbosa falou várias vezes que o TCU mudou o entendimento e aí eles se adequaram. Portanto, não estariam irregulares antes porque nada pode retroagir. Os fatos: o que o TCU fez foi lembrar ao governo que ele deveria se enquadrar nas exigências legais. O governo então recorreu ao próprio TCU e enquanto não era analisado o recurso dizia que o assunto estava em suspenso.
A Lei de Responsabilidade Fiscal não é uma lei menor, que se possa desprezar o seu cumprimento. Ela nasceu do esforço de décadas do país de corrigir a desordem fiscal que levou à hiperinflação. O governo Dilma feriu a lei de forma sistemática e isso teve influência política. Gastou-se muito, os rombos foram escondidos por manobras, isso permitiu despesas maiores em ano eleitoral, e desorganizou a economia após as eleições. Esta é a verdade, o resto é enganação.
*Miriam Leitão
(Com Alvaro Gribel, de São Paulo)

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