sábado, 10 de janeiro de 2009

O minucioso trabalho de Patrícia Pillar como Flora

Quando aceitou o convite para viver a Flora de A Favorita, Patrícia Pillar sabia que estava correndo um risco. Aos 44 anos e dona de uma carreira pontuada por personagens do bem, encararia sua primeira vilã, na primeira novela em horário nobre de um autor jovem e disposto a contrariar os modelos consagrados por seus pares mais experientes. A Flora criada por João Emanuel Carneiro entrou em cena como uma ex-presidiária com jeito de santinha injustiçada, revelou-se uma assassina dissimulada e caiu em desgraça à medida que foi engolida por suas carências afetivas. Poderia facilmente descambar para uma vilã memorável, mas caricata, como a Nazaré de Renata Sorrah em Senhora do Destino. No entanto, essa trajetória inverossímil ganhou consistência. Graças a um milimétrico trabalho de construção da personagem, Flora afirmou-se como uma das vilãs mais complexas já surgidas nas novelas brasileiras e fez de A Favorita um sucesso em sua reta final. "Ela alcançou o olhar legítimo do psicopata, da falta de sentimento. Inclina levemente o rosto para baixo e ergue sutilmente os olhos, como um predador", diz a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do livro Mentes Perigosas: o Psicopata Mora ao Lado, usando a foto desta página como exemplo. A trajetória da vilã é a chave para a escalada de A Favorita no ibope. A novela tem audiência média modesta, de 40 pontos. Mas, desde dezembro, vários capítulos chegaram perto dos 50. Aquele em que Silveirinha (Ary Fontoura) troca de lado, aliando-se a Donatela (Claudia Raia) contra Flora, bateu em 51 pontos, o recorde desde o início da trama. Esse desempenho acabou dando trabalho extra a Carneiro na reta final. Na quinta-feira, a oito dias do gran finale, o destino de Flora foi revelado por um jornal carioca. Irritado com o vazamento dessa e de outras cenas importantes, o autor decidiu fazer mudanças no último capítulo. Na versão tornada pública, a punição reservada à megera era ficar prisioneira de sua fixação maníaca pela irmã postiça Donatela. Ela voltaria para a cadeia, onde, ao vê-la lavando as calcinhas de outras presidiárias, uma novata perguntaria seu nome e ela diria: "Donatela". No novo desfecho, será mantida a punição retumbante que se costuma reservar aos grandes vilões de novelas. Mas o que exatamente acontecerá com a protagonista só será decidido o mais perto possível da gravação da cena. O certo é que, na última semana, a vilã mergulhará cada dia mais na espiral de loucura em que entrou desde que se apoderou do rancho dos Fontini – família em torno da qual giraram muitas de suas crueldades – e cobriu as paredes com cartazes da dupla sertaneja Faísca e Espoleta, que formou vinte anos antes ao lado de Donatela.

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