Quanto mais mentem à vontade e sem constrangimento os cínicos que nos governam ou representam, pior é a qualidade de suas mentiras. De fato, a perda de qualidade tem tudo a ver com o grau de nossa indignação diante do que Dilma chama de malfeitos.
Se nos indignamos pouco ou quase nada para que sofisticar as mentiras e torná-las verossímeis?
A mais recente e reles mentira oferecida ao nosso exame foi publicada na última ediçãoda VEJA. O mecânico Irmar Silva Batista, filiado ao PT há 20 anos, tentou criaro Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Reparação de Veículos eAcessórios no Estado de São Paulo.
Em 2008, elebateu à porta do Ministério do Trabalho para tratar do assunto com o entãosecretário de Relações do Trabalho, o ex-deputado Luiz Antonio de Medeiros. Oministro já era Carlos Lupi, presidente do PDT. Medeiros encaminhou Irmar aEudes Carneiro, assessor de Lupi.
Eudestrancou-se com Irmar em uma sala. Primeiro, pediu-lhe que desligasse o telefonecelular. Em seguida cobrou R$ 1 milhão para liberar o registro do sindicato.Irmar denunciou o caso a parlamentares do PT – entre eles, o senador EduardoSuplicy. Sem sucesso. Então escreveu uma carta a Lula. Sem resposta.
Um mêsdepois da posse de Dilma, Irmar enviou-lhe uma carta por e-mail contando emdetalhes tudo o que se passara. Mandou cópia para Gilberto Carvalho,secretário-geral da presidência.
No dia 9 demarço último, o Palácio do Planalto confirmou o recebimento da carta.
Na semanapassada, a assessoria de imprensa da presidência informou que nenhumaprovidência a respeito pode ser tomada porque o trecho da carta que narrava apatifaria acabara cortado da mensagem.
Não éespantoso? Sumiu da carta justamente o trecho onde Irmar denunciava o grupo queagia no Ministério do Trabalho pedindo dinheiro para liberar registro sindical.
Mas sumiucomo? Não se sabe. Assim como ainda não se sabe se a carta para Gilbertoapresentou a mesma falha.
Vai ver otrecho mais explosivo dela chegou truncado aos seus destinatários. Vai ver quemdigitou o e-mail pulou o trecho. Custava a quem o recebeu alertar seu autor queficara faltando um trecho? Assim a carta poderia ter sido reenviada.
Bons temposaqueles onde um dossiê da Casa Civil sobre despesas sigilosas do governoFernando Henrique foi batizado por Dilma de banco de dados. Fazia até algumsentido – embora fosse mentira.
E o mensalãoque Lula se empenhou para que fosse confundido com Caixa 2?
Mensalão écrime. Caixa 2 também é. Mas Caixa 2 soa como um crime leve, quase inocente.
O quealimentou o mensalão foi dinheiro desviado de órgãos públicos. Se preferir,"recursos não contabilizados", como observou com deslavada hipocrisiao ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares.
Montagem defalso papelório político para uso contra adversários é coisa de bandido noslugares onde as palavras correspondem ao seu verdadeiro significado.
Aqui foicoisa de "aloprado" – um sujeito que age por conta própria paraajudar a se reeleger quem repele ajuda desse tipo.
Sobreviveuao governo anterior e atravessará o atual uma das mais perigosas mentirasjamais produzidas. Atende pelo nome de "controle social da mídia".
Seria maisadequado referir-se a ela como "censura". Diz-se que o controle sefará sem interferir no conteúdo. Quem acredita?
A mãe detodas as mentiras é também a mais perversa. Ela atribui a bandalheira àgovernabilidade.
Como paragovernar é preciso contar com maioria de votos no Congresso ounas Assembléias, os partidos abiscoitam cargos e fazem com eles o que bementendem. De preferência, roubam.
Abandalheira não decorre da necessidade de contar com o apoio de partidos.Decorre da falta de princípios e de coragem do governante para valer-se daforça do mandato obtido mediante o voto popular.
Afinal,para que servem os milhões de votos que elegem um presidente ou governador?
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